Os dois caminhos

7 O temor do Senhor é o princípio da ciência; os loucos desprezam a sabedoria e a instrução. 8 Filho meu, ouve a instrução de teu pai e não deixes a doutrina de tua mãe. 9 Porque diadema de graça serão para a tua cabeça e colares para o teu pescoço. 10 Filho meu, se os pecadores, com blandícias, te quiserem tentar, não consintas. 11 Se disserem: Vem connosco, espiemos o sangue, espreitemos sem razão os inocentes, 12 traguemo-los vivos, como a sepultura, e inteiros, como os que descem à cova; 13 acharemos toda sorte de fazenda preciosa; encheremos as nossas casas de despojos; 14 lançarás a tua sorte entre nós; teremos todos uma só bolsa. 15 Filho meu, não te ponhas a caminho com eles; desvia o teu pé das suas veredas. 16 Porque os pés deles correm para o mal e se apressam a derramar sangue. 17 Na verdade, debalde se estenderia a rede perante os olhos de qualquer ave. 18 E estes armam ciladas contra o seu próprio sangue; e a sua própria vida espreitam. 19 Tais são as veredas de todo aquele que se entrega à cobiça; ela prenderá a alma dos que a possuem. Provérbios 1:7-19

O livro de provérbios coloca-nos sempre perante uma escolha. Indica-nos dois caminhos. A escolha de um leva sempre à rejeição do outro. Mas este livro não se limita a apresentar uma escolha que inevitavelmente teremos que fazer, usando o nosso livre-arbítrio. Diz-nos que as nossas opções têm sempre consequências. Vai mais longe, não é indiferente à nossa decisão. Mostra-nos qual o caminho da sabedoria, da bênção, da salvação, e, ao mesmo tempo, apresenta o caminho da loucura, do pecado e do mal.

No texto de hoje, com que se inicia este livro, somos confrontados com uma dessas escolhas. Estamos perante um pai que chama a atenção do seu filho para o perigo da violência e dos homens violentos. Não somos informados sobre a idade do filho. Poderemos imaginar que se trata de uma criança ou adolescente em plena aprendizagem. Poderá parecer-nos à primeira vista que este tema não tem muito a ver com os dias de hoje, que estes conselhos seriam mais adequados a uma época longínqua em que a violência estava sempre presente. Por que é que a violência seria apelativa? Talvez pensemos que estas são realidades que dificilmente nos atingem nos dias que correm. Será? Deixa-me dizer-te que quanto mais leio a Bíblia mais descubro a sua flagrante actualidade. Se não, vejamos:

Uma tendência natural

As crianças alegram os nossos dias, são muitas vezes a imagem da ternura e da graciosidade. Mas essa não é verdadeira realidade. Ou por outra, essa não é a única realidade. Quem quer que lide com os mais novos, sabe que as crianças são também capazes de actos de extrema crueldade. Desde logo para com os mais fracos. Veja-se os casos de bullying que levam a extremos de sofrimento inimagináveis e até mesmo ao suicídio. Segundo um relatório da Unicef, um em cada três alunos passa por situações de bullying e está envolvido em actos de violência. Metade dos adolescentes a nível global passa por situações de violência entre pares na escola ou nas imediações desta.

A violência é apelativa

Sabem-no bem os produtores de programas de televisão, os vendedores de jogos de computador e os produtores de conteúdos na internet. Quem idealiza estes conteúdos sabe que, “naturalmente” as crianças são atraídas pela violência. E sabemos que uma criança começa a ver televisão por volta dos dois anos e aos seis já é um consumidor habitual.

O conselho dos pais

Os versículos 8-19 são dirigidos a um filho jovem e inexperiente. A sabedoria fala através de um pai e de uma mãe. Podemos imaginar um jovem entre a infância e a adolescência, na antecâmara da idade adulta e a ter que tomar as suas próprias decisões. É uma idade em que se valoriza mais a opinião dos pares do que a dos pais, cujos valores são questionados e desvalorizados.

Estes pais sabem que o filho ainda não teve verdadeiramente um contacto com o mundo violento, mas tentam exercer uma acção preventiva. Diz-se que é de Mark Twain a frase: “É mais fácil estar fora do que sair”.

O que oferecem os homens violentos?

Os versículos 11-14 vão ser mais específicos. O pai tem normalmente a tendência para começar o seu discurso desta forma: “Sabes, meu filho, no meu tempo, quando eu tinha a tua idade…”. Para o jovem não passa de história que nada tem a ver com a sua vida real. Contudo, este pai, que também nos interpela, não fala do passado, mas do futuro. Prevê a realidade que o seu filho está prestes a enfrentar e previne-o. Sabe o que o mundo vai oferecer. O que poderá parecer tão apelativo?

  1. Aceitação e identidade de grupo.
    Os adolescentes criam a sua autoestima a partir a opinião dos seus pares. A opinião dos pais é desvalorizada. Adquire uma extrema sensibilidade à opinião dos outros e uma forte inclinação para ser aceite no grupo. A pressão dos pares nunca foi tão forte. Tenta “impressionar” os outros para obter segurança e o sentido de identidade. Não que o sentido de grupo seja mau. Pode ser também o meio para influenciar para o bem, como bem sabia o autor de Hebreus:

    24 E consideremo-nos uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras, 25 não deixando a nossa congregação, como é costume de alguns; antes, admoestando-nos uns aos outros; e tanto mais quanto vedes que se vai aproximando aquele Dia. Hebreus 10:24-25

    O mal não está no grupo, mas no tipo de grupo.

  2. Promessa de ganhos materiais.

    13 acharemos toda sorte de fazenda preciosa; encheremos as nossas casas de despojos; 14 lançarás a tua sorte entre nós; teremos todos uma só bolsa. (v. 13-14)

    A prosperidade nunca é considerada um mal em Provérbios. Muitas vezes é também ela uma consequência da sabedoria. O que é condenado é o lucro que resulta da violência e da ilicitude.

O apelo final de um pai.

Nos versículos 15-19 este pai faz um apelo final.

No v. 15 o filho é aconselhado a desviar-se do caminho que acaba de ser descrito. Este caminho leva ao derramamento de sangue. À violência. Aquele que segue este caminho destrói não só os outros, mas também a si próprio, enredado nas suas próprias armadilhas. Na verdade, a cobiça prende a alma dos que a possuem.

Conclusão

O Capítulo 1 de Provérbios traça os dois caminhos que podemos escolher. O caminho da sabedoria ou o caminho da perversidade. No caminho da perversidade estão aqueles cuja ganância leva à violência. O caminho da sabedoria vem do temor a Deus. E aqui regressamos ao início deste texto: “O temor do Senhor é o princípio da ciência” ou do conhecimento. Ao longo de todo este livro veremos que é sempre este o princípio que está na base da verdadeira sabedoria: o temor do Senhor. Não o medo, mas a reverência. Na verdade, o reconhecimento de quem é a soberania de todos os seres e de todas as coisas.

Sempre estamos perante esta escolha. E sabemos que não é fácil. Como sabia aquele pai que talvez tivesse a consciência do poder dos obstáculos que o seu filho teria que enfrentar. Com também nos desafiou o Senhor Jesus:

13 Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela; 14 E porque estreita é a porta, e apertado, o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem. Mateus 7:13-14

José Alves

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