O Livro dos Salmos é na verdade uma colectânea, pois os 150 salmos que o compõem estão divididos em 5 livros. Não se sabe ao certo quando esta organização do livro tomou a sua forma final, mas ela vem assinalada em muitas das versões da Bíblia correntemente em uso e dá-se nos seguintes pontos:
Livro I – Salmos 1 a 41 ; Livro II – Salmos 42 a 72; Livro III – Salmos 73 a 89; Livro IV – Salmos 90 a 106; Livro V – Salmos 107 a 150
O fim de cada parte é assinalado por uma doxologia, visível no próprio texto do último salmo de cada colecção, consistindo esta fórmula de glorificação numa benção, usualmente uma variante da forma “Bendito seja o Senhor”, provavelmente pronunciada pelo sacerdote, e seguida por uma resposta da congregação com “Amén”. A excepção é o final do livro como um todo, com o salmo 150, que termina com a expressão “halleluyah”.
A tradição judaica explica esta divisão dos Salmos em cinco livros como um eco do Pentateuco. Não há certezas quanto a este motivo, mas esta sugestão é interessante, pois para além do papel importante que a Tora tem nos Salmos, une igualmente David a Moisés. Ou seja, se Moisés está ligado à instituição da liturgia, do ritual, das festas sagradas, dos sacrifícios e dos sacerdotes, com o tempo estas actividades vieram a estar igualmente associadas à pessoa do rei. De certa forma, seria como se David fornecesse a letra e a música (o conteúdo) para acompanhar muitas das cerimónias que Moisés tinha estabelecido. E da mesma forma que a figura do rei é entrevista no Pentateuco, Moisés vai estar presente nos Salmos, em especial no Livro IV.
Para além desta divisão em 5 livros, é possível igualmente distinguir algumas colecções específicas de salmos, com diferentes origens e que atravessam as fronteiras dos diferentes livros. São exemplo disto os salmos de David, os salmos de Coré, os salmos de Asaf e outras.
Esta forma final do livro afecta a sua interpretaçao, bem como a sua teologia. Não nos é possível abordar os diferentes estudos que tentam iluminar a utilização dos salmos ao longo da história de Israel. No entanto, pela sua simples leitura podemos perceber uma oscilação entre o foco corporativo e o individual. E, se como vimos na 1ª semana, muitos concordam que na sua posição actual os salmos 1 e 2 constituem uma introdução ao livro como um todo, estes salmos reflectem não só a necessidade de ler, estudar e meditar no seu conteúdo como apontam também para a utilização desta colectânea em celebrações litúrgicas.
Nesta perspectiva surge-nos o salmo 2, um salmo composto para uma cerimónia de coroação, onde tradicionalmente o rei era coberto com vestes resplandecentes e especiais. Por um lado, trata-se de uma variação poética do decreto da aliança de Deus com David e seus descendentes em II Samuel 7:8-16, e é fundacional para o entendimento do livro dos Salmos. Aliás, esta aliança é tão importante que volta a ser relembrada no salmo 89 num ponto muito especial do livro. Por outro lado, as “vestes” impostas sobre o Rei são tão imponentes que com o passar do tempo nenhum rei parece estar verdadeiramente à altura de as envergar. Tal facto conduz-nos, por fim, à utilização do livro dos Salmos no Novo Testamento, (tema que viremos a abordar no futuro) e à profusa aplicação de salmos a Jesus, Filho de David, Filho de Deus, o verdadeiro Rei.
Os livros I e II apresentam aquele que vai ser um dos principais temas do livro – o rei em oração – e estão claramente ligados à pessoa de David. A presença nos primeiros 72 salmos de cerca de 60 a ele atribuidos, justifica a afirmação no final do salmo 72 de que se tratam das orações de David. E se o salmo 2 invoca a aliança de Deus com David e proclama o controlo soberano de Deus sobre a História, no resto dos dois primeiros livros há uma espécie de desenvolvimento desse pacto lembrando que mesmo no meio de aflições e inimigos, o Senhor protege e segura o seu ungido. O livro II termina no salmo 72 com múltiplas petições para o rei: para que ele reine com justiça, para que desfrute de segurança e para que seja abençoado bem como a sua descendência, que assim continuará a beneficiar da aliança de Deus com David, mas depois chegamos ao livro III… (Mais sobre isto na próxima semana)
Por hoje, deixamo-vos com o salmo 2.
Salmo 2
1 Por que se amotinam as nações, e os povos tramam em vão?
2 Os reis da terra se levantam, e os príncipes juntos conspiram contra o Senhor e contra o seu ungido, dizendo:
3 Rompamos as suas ataduras, e sacudamos de nós as suas cordas.
Santo Deus, acabo de ler no Evangelho de S. João, capítulos 11 e 12, os dias que antecederam a crucificação e a morte do Teu filho, Jesus – leio como Tu tinhas demonstrado, uma vez mais, o Teu poder ao ressuscitar Lázaro, como na casa de Marta e Maria, esta Te tinha ungido com um perfume caríssimo e como, ao mesmo tempo, os fariseus e principais dos sacerdotes conspiravam para Te matar.
Porque conspiram os poderosos contra Ti, Senhor, e contra o Teu ungido? Porque rejeitam estar debaixo do senhorio do Teu escolhido?
4 Aquele que está sentado nos céus se rirá; o Senhor zombará deles.
5 Então lhes falará na sua ira, e no seu furor os confundirá, dizendo:
6 Eu tenho estabelecido o meu Rei sobre Sião, meu santo monte.
Eu Te escuto, Senhor Deus do Universo. Abre os meus ouvidos para entender a Tua ação na História. … Sei que prometeste abençoar a descendência de Davi e dessa raiz veio um Rei, no qual não houve pecado, perfeito, e que contra tudo o que era expectável, foi glorificado na cruz, ressuscitou em poder e está entronizado junto ao Pai.
Dou graças por Jesus, o Cristo, o Messias, o Teu ungido. Agradeço-Te, porque Ele é o cumprimento de todas as promessas feitas a Abraão e a Davi…
O apóstolo Paulo (no livro dos Atos, cap. 13) torna isto bastante claro ao citar este mesmo salmo, o segundo, para anunciar aos judeus que Jesus, o Filho de Deus, era o Rei tão ansiado, o Rei que viera para reinar finalmente sobre toda a terra, para bênção e cura de todas as nações.
7 Falarei do decreto do Senhor; ele me disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei.
8 Pede-me, e eu te darei as nações por herança, e as extremidades da terra por possessão.
9 Tu os quebrarás com uma vara de ferro; tu os despedaçarás como a um vaso de oleiro.
Sim, Senhor Jesus, a Ti foi dada toda a autoridade no céu e na terra, e todo aquele que se rebelar contra Ti, não prevalecerá. É debaixo do Teu poder e do Teu governo que todos nós nos encontramos, quer o reconheçamos ou não.
10 Agora, pois, ó reis, sede prudentes; deixai-vos instruir, juízes da terra.
11 Servi ao Senhor com temor, e regozijai-vos com tremor.
Também eu atento para estas Tuas palavras, Senhor. Louvo-Te por Tu és um Rei que se entrega em lugar do seu povo, em meu lugar… Tu és um Deus de amor e um Deus de justiça. Não há qualquer outro a quem eu me queira submeter, senão a Ti. Cada área da minha vida eu rendo a Ti. Reina em mim, Senhor! Reina no meu lar e na minha família…
Santo Espírito, ensina-nos a servir o nosso Rei e Senhor com reverência e com alegria, nesta altura e sempre.
Revela-nos também os aspetos da nossa vida, nos quais precisamos de mostrar mais devoção e lealdade para contigo.
12 Beijai o Filho, para que não se ire, e pereçais no caminho; porque em breve se inflamará a sua ira. Bem-aventurados todos aqueles que nele confiam.
Ó Senhor, perdoa-nos as vezes em que Te traímos com um beijo…
Mas hoje a Tua graça nos invade e nos lança a Teus pés. Sentimo-nos como Maria, profundamente grata, ungindo Teus pés com o que de melhor tinha. Amamos-Te de todo o nosso coração, Jesus. Beijamos-Te, Filho de Deus.
Submetemo-nos à Tua vontade e confiamos em Ti, nosso Rei.
Abençoa-nos, Senhor, para que não pereçamos no caminho.
Amém.
José e Marta Pego e Pinto